Investidores, consumidores e empresas dão sinais de que as mudanças sistêmicas rumo à sustentabilidade estão em curso. O desafio ainda é dar escala e celeridade a este movimento

Por Andrea Vialli

Foto: Egor Vikhrev/ Unsplash

Marcado pela pandemia da Covid-19, o ano de 2020 frustrou tentativas de planejamento por parte de empresas e organizações. Entre demissões e home office, a preocupação com a sobrevivência ocupou corações e mentes, especialmente nos meses mais delicados da quarentena e do isolamento social. Ao mesmo tempo, pesquisas diversas captaram o aumento do questionamento, entre os cidadãos, sobre seu papel no mundo, as relações familiares, suas escolhas de consumo e o impacto da presença humana no planeta.

Ainda paira a dúvida se a pandemia transformará de fato comportamentos humanos e se isso se refletirá em mudanças sistêmicas rumo à maior transparência nas informações que chegam aos cidadãos e a padrões de produção mais sustentáveis por parte das companhias. Mas há pistas que apontam para uma transformação em curso, seja no campo dos investimentos, seja do consumo, seja nas estratégias empresariais.

Nos investimentos, este foi o ano em que mais se falou em ESG no País, mesmo o conceito tendo sido lançado oficialmente há mais de uma década, com a criação do Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), em 2005. 

No consumo, uma sondagem da consultoria Accenture com 3 mil consumidores em 15 países, lançada em maio, mostrou que 64% dos entrevistados afirmaram estar mais focados na redução do desperdício de alimentos e que manterão esse comportamento no pós-pandemia. Do total, 45% afirmaram fazer escolhas sustentáveis em suas compras e que também manterão esse comportamento. 

Nas estratégias empresariais, há exemplos vindo tanto de pequenas empresas, cada vez mais atentas às demandas do consumidor por sustentabilidade, quanto de conglomerados ligados à cadeia da carne bovina, que avançaram em compromissos para aumentar a rastreabilidade de fornecedores indiretos e dar disclosure dessas informações.

“Estamos vivenciando outro padrão de consumo e de comportamento, com a régua mais alta. Tenho participado de muitas conversas sobre ESG, e vejo entrar no mercado um investidor que acha relevante tudo isso de que estamos falando. A geração atual quer saber de onde vem a carne, se causa desmatamento, se o alimento tem muito sódio”, diz Fábio Colletti Barbosa, sócio da Gávea Investimentos e membro do conselho de grandes empresas, como Natura, Itaú Unibanco e Hering.

Como ex-presidente do Banco Real, depois adquirido pelo grupo espanhol Santander, Barbosa teve papel relevante em trazer inovações em sustentabilidade para o setor bancário – como o Fundo Ethical, de 2001, primeiro fundo de investimentos com temática ESG lançado por um banco privado; e a adoção de análise de risco socioambiental na concessão de crédito. 

Em webinar sobre critérios ESG e risco financeiro realizado pelo escritório Veirano Advogados, de São Paulo, Barbosa relembrou casos emblemáticos dos primórdios do ESG no Brasil. Primeiramente, o banco começou a restringir crédito para empresas que não tinham boas práticas, como uma madeireira no Paraná que estava desmatando a Mata Atlântica além do permitido. No segundo momento, conta o executivo, a ideia era agir de forma mais educativa, ajudando as empresas a se adequarem a novos padrões. “Outro caso foi de uma empresa do Ceará que estava praticando pesca predatória do camarão. Em vez de cortar o crédito da empresa, o banco financiou a contratação de um oceanógrafo que ensinou a empresa a trabalhar de forma sustentável”, diz Barbosa. 

Com essas práticas, foram surgindo clientes que perceberam que a então chamada responsabilidade socioambiental poderia ser um diferencial competitivo na hora de pedir um empréstimo. “Quando uma empresa que produzia madeira certificada no Pará procurou o banco para fazer negócios, descobrimos que havia um nicho a ser explorado”, acrescenta o ex-presidente do Banco Real.

Chamado de “banqueiro verde” e “abraçador de árvores”, Barbosa e suas equipes acabaram antecipando tendências que chegariam, enfim, a ser postuladas pelo regulador. No início de setembro, o Banco Central do Brasil anunciou que as instituições financeiras terão de reportar seus riscos e oportunidades associados à mudança climática nos moldes da Força-Tarefa sobre Divulgações Financeiras Relacionadas ao Clima (TCFD na sigla em inglês), e lançará uma consulta pública sobre o tema no ano que vem, com adoção mandatória a partir de 2022. 

O Bacen também propôs a criação de uma espécie de cadastro positivo verde para direcionar o crédito rural para práticas sustentáveis no campo. A ideia é tanto reforçar o veto a produtores em desconformidade ambiental quanto premiar aqueles que possuem ou querem adotar práticas mais sustentáveis. A medida deve abranger todo tipo de crédito rural (custeio e investimento), um mercado anual da ordem de mais de R$ 200 bilhões em mais de 2 milhões de operações. 

O “tsunami” ESG que está varrendo o universo dos negócios hoje é resultado não apenas da pandemia, mas de um processo que já vinha norteando os investidores mundo afora, com o assunto em pauta no Fórum Econômico de Davos, a TCFD, as iniciativas empresariais para reduzir emissões e combater a mudança do clima, e as cartas de Larry Fink, CEO da BlackRock, aos investidores, responsáveis por ditar tendências de mercado, com ênfase na sustentabilidade. A BlackRock é a maior gestora de investimentos do mundo, com US$ 7 trilhões em ativos.

No Brasil, embora várias gestoras de ativos e bancos tenham lançado produtos com viés ESG em anos anteriores (muitos deles replicando a carteira do ISE), o tema estava restrito a um nicho. Mas a pressão global movimentou o mercado no último ano: muitos fundos perceberam que já não conseguiam captar recursos no exterior sem a adoção de critérios ESG e passaram a incluir o tema na agenda (mais sobre ESG em entrevista ao fim desta reportagem). 

A XP Investimentos, uma das gestoras de maior visibilidade atualmente, navega nessa direção. Este ano, estruturou sua área de
sustainable wealth – expressão utilizada pela indústria de fundos internacional que significa literalmente “riqueza sustentável” –, lançou seus primeiros três fundos de investimentos sustentáveis e pretende alocar R$ 100 milhões em capital-semente para desenvolver essa indústria no País. 

Segundo Marcela Ungaretti, analista ESG da XP, o interesse cada vez maior pelos temas sociais, ambientais e de governança tem transformado rapidamente a indústria de investimentos no mundo todo e é um indício do que está por vir no Brasil.

“A pandemia do coronavírus agiu como um catalisador e vemos razões estruturais pelas quais a participação dos investimentos ESG continuará ganhando força no Brasil. Em nossa visão, as empresas que não se adaptarem a esse novo cenário ficarão para trás”, diz a analista. 

O apetite do mercado por informações ESG também pressiona as empresas para que façam o disclosure dessas informações, de modo mais transparente do que o que é habitualmente relatado nos relatórios de sustentabilidade das companhias.

O ato de consumir de forma mais sustentável também tende a ser um hábito mais incorporado durante e após a pandemia, como captam diferentes pesquisas de mercado. “Apesar de ainda não ser possível prever claramente o aumento da consciência de consumo decorrente da pandemia, o que se observa é uma aceleração da tendência do consumo consciente, que exclui excessos e prioriza o que é essencial”, diz Larissa Kuroki, coordenadora de conteúdos e metodologias do Akatu. 

O isolamento social fez ainda com que as pessoas passassem mais tempo em casa, observando de modo mais intenso o impacto do seu consumo por meio da geração de resíduos, compra de alimentos, uso de energia e água. Isso foi positivo para o consumo consciente, pois os consumidores passaram a buscar maneiras de economizar em todos esses aspectos para não sofrer no final do mês com contas de água e luz mais altas, por exemplo – oportunidade para incentivar as pessoas a manterem tais práticas para além da pandemia, observa Kuroki. 

Outras mudanças que levariam décadas para ser implementadas naturalmente tiveram de ser adotadas no susto – é o caso do home office, rechaçado por muitos empregadores, que agora são aderentes à prática. Só na capital paulista, o fechamento de estabelecimentos na quarentena e a adoção do escritório em casa levou a uma redução de 50% das emissões de gases de efeito estufa nos meses de março e abril, de acordo com a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb).

O Akatu, por meio de estudos, monitora o panorama do consumo consciente no Brasil desde 2002. A última pesquisa, de 2018, entrevistou 1.090 pessoas de 12 regiões do País e avaliou o quanto algumas atitudes fazem parte da rotina dos entrevistados e seus hábitos de compra, dividindo o grau de consciência dos brasileiros em quatro perfis: indiferente, iniciante, engajado e consciente. 

Segundo Kuroki, os percentuais de consumidores mais conscientes se mantiveram relativamente estáveis ao longo dos anos. Mas, de 2012 para 2018, houve aumento de 32% para 38% na parcela dos iniciantes: são aqueles consumidores que aderem a comportamentos que trazem economia clara e no curto prazo e encontram barreiras na mudança de hábitos, além de desconfiarem das informações contidas nos produtos. 

Ainda segundo a pesquisa, 68% dos brasileiros dizem já ter ouvido falar em sustentabilidade, mas as principais barreiras para a adoção dessas práticas pelos consumidores são a necessidade de esforço para a mudança de hábitos e a percepção de que os produtos mais sustentáveis são mais caros e difíceis de encontrar no comércio.

“É preciso uma mudança de mindset do consumidor para que este passe a acreditar que suas ações têm relevância. Assim, qualquer mudança de comportamento visando menor impacto, se praticada por um grupo de pessoas, durante certo período de tempo, tem o potencial de causar enorme impacto positivo”, diz a coordenadora de conteúdos e metodologias do Akatu. 

O nicho dos engajados e conscientes, que somam 24% dos consumidores brasileiros, segundo o Akatu, é o público-alvo de empresas atentas a esse movimento. A pequena Insecta Shoes, marca de sapatos e acessórios veganos fundada em 2015, mira esse consumidor mais engajado, mas que também busca design e informação de moda, e adota ações de transparência (saiba mais no quadro ao fim desta reportagem). 

Passar de uma ação orientada pela gestão do risco comercial e de reputação (postura mais reativa) para uma gestão baseada na oportunidade gerada pelas demandas do consumo sustentável, tornou-se o grande desafio para as empresas. Na cadeia de produção da carne bovina, por exemplo, grandes frigoríficos têm sido cada vez mais pressionados por investidores, redes do varejo e consumidores a adotar medidas de rastreabilidade para mapear suas cadeias de fornecimento e evitar que suas marcas estejam associadas ao desmatamento da Amazônia e do Cerrado e ao trabalho análogo ao escravo. 

Esse movimento, fruto de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado em 2009 entre o Ministério Público Federal e frigoríficos que atuam na Amazônia Legal, permitiu avanços no mapeamento da cadeia de fornecedores diretos pelos principais frigoríficos que compram gado da região – caso da Marfrig, da Minerva Foods e da JBS. Mas ainda há lacunas na rastreabilidade dos fornecedores indiretos, especialmente nas fazendas de cria, que produzem os bezerros, e que são o primeiro elo da cadeia – depois esse gado será vendido para as fazendas que fazem a recria e engorda e fornecem diretamente para os frigoríficos.

A Marfrig anunciou, em julho, um conjunto de compromissos e metas, acompanhado de um plano de execução, para os biomas Amazônia e Cerrado, em uma linha do tempo que vai até 2030. Os compromissos estão centrados em quatro pilares (rastreabilidade, inclusão, desmatamento zero e transparência) e pressupõem um trabalho em rede, em parcerias com setor privado, academia, ONGs, governo e Ministério Público, além de plataformas transparentes para que a sociedade possa acompanhar o ritmo de cumprimento das metas. 

Desde o TAC de 2009 a empresa estruturou um modelo de georreferenciamento e monitoramento via satélite que permite acompanhar 26 milhões de hectares na Amazônia. Agora, uma das metas é avançar no monitoramento dos fornecedores indiretos, ponto crítico da cadeia da carne. Uma das ferramentas para isso são os mapas de risco, que cruzam dados de vegetação com os fornecedores de cria e recria, permitindo identificar as áreas mais suscetíveis ao desmatamento.

Até o fim de setembro, a empresa pretende ter o mapa de cria funcionando para os biomas Cerrado e Amazônia, fruto de uma parceria com a empresa Agroicone. “Só na Amazônia, temos 16 mil fornecedores, sendo que 3.500 estão bloqueados por inconformidades. Queremos levar para esses bolsões de maior risco o conhecimento e o engajamento dos produtores para melhores práticas”, diz Paulo Pianez, diretor de sustentabilidade da Marfrig. 

A estratégia da Marfrig, explica o executivo, é não se limitar a bloquear os fornecedores que estão na ilegalidade, mas também promover a inclusão desses produtores na cadeia, com assistência técnica e conhecimento para que adequem sua situação. Com isso, a meta da empresa é eliminar o desmatamento ao longo de sua cadeia no bioma amazônico até 2025 e estender o geomonitoramento via satélite para o Cerrado, de modo a alcançar o desmatamento zero nos dois biomas até 2030.

A incorporação de novas tecnologias de rastreabilidade dos rebanhos também é a estratégia empregada pela Minerva Foods para mapear e monitorar mais de 9 mil fornecedores na Amazônia, espalhados por uma área de 9 milhões de hectares – em 2019, 2.400 deles foram bloqueados por não estar em conformidade ambiental, trabalhista e fundiária. 

Com 80% da produção voltada à exportação e capital em private equity da International Finance Corporation (IFC), braço para investimentos privados do Banco Mundial, a companhia sente o aumento da pressão por padrões ESG oriunda dos mercados nos últimos oito anos. “De 2012 para cá, a empresa investiu continuamente para ter o melhor sistema de monitoramento de fornecedores diretos, condição exigida pelos investidores. Agora o desafio é monitorar os indiretos com a mesma qualidade”, diz Taciano Custodio, diretor de sustentabilidade da Minerva Foods. 

Segundo o executivo, os três primeiros anos desde a assinatura do TAC foram marcados pela indisponibilidade de ferramentas para rastrear a cadeia da pecuária bovina na Amazônia, situação que foi corrigida com o monitoramento do sistema Prodes, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e com a inscrição dos produtores no Cadastro Ambiental Rural (CAR). A produtividade do gado também evoluiu no período: em 2019, 80% da produção da Minerva foi originada de sistemas de intensificação da produção, com média de abate de 30 meses – em 2014, a média era de 36 meses, o que faz diferença na pegada de carbono do gado. 

Apesar desses avanços, Custodio afirma que o setor ainda tem o desafio de avançar como um todo nas ferramentas de rastreabilidade, especialmente os frigoríficos de pequeno e médio porte, cuja produção está voltada para o mercado doméstico. “Hoje, a Minerva Foods representa 4% do abate do gado na Amazônia. Se juntarmos os três principais frigoríficos que atuam na região, é 30%. O restante da cadeia permanece sem monitoramento e rastreabilidade”, diz. 

Força-Tarefa

“A adoção da TCFD pelos bancos a partir de 2022 vai provocar um efeito cascata no sistema financeiro”

Nesta entrevista, o gerente de relacionamento do Princípios para o Investimento Responsável (PRI, na sigla em inglês) no Brasil, Marcelo Seraphim, falou sobre a “explosão” do conceito ESG, a preocupação dos investidores com a Amazônia e a necessidade de aumentar a transparência nas informações sobre o clima. Os PRI constituem uma rede internacional de investidores apoiada pelas Nações Unidas para impulsionar a sustentabilidade nos investimentos. Criada em 2006, conta com mais de 3.200 membros em todo o mundo, que representam US$ 103 trilhões em ativos sob gestão. 

Em 2020, o tema ESG está muito presente na mídia, com muitas matérias abordando o assunto e gestores de recursos lançando fundos com a temática. O mercado brasileiro acordou para o tema?

O mercado brasileiro reflete uma tendência global do aumento de conscientização sobre o tema. Mas, mais recentemente, os investidores brasileiros têm percebido que administrar os fatores ESG é um instrumento poderoso de gestão de riscos. Diversos fatores impulsionaram isso: primeiro, o senso de urgência que existe hoje no mundo com relação à mudança climática e à necessidade de fazermos uma transição rápida para a economia de baixo carbono. Um segundo fator foi a responsabilidade das empresas perante tragédias como as que ocorreram em Mariana e Brumadinho, que obrigaram uma multinacional brasileira a esclarecer a diferentes atores (governo, acionistas, sociedade) sobre as causas e medidas tomadas para remediar os impactos sociais e ambientais, ao mesmo tempo em que tinha de gerenciar os impactos financeiros em suas operações e nos valores dos ativos. Um terceiro fator que influenciou esse despertar do investidor brasileiro para o tema foi o aumento do desmatamento, principalmente na Amazônia. Outro divisor de águas foi a carta da BlackRock aos seus acionistas, que anunciou medidas de descarbonização do portfólio e, mais recentemente, votou contra a reeleição de conselheiros em mais de 50 empresas, por não concordar com o desempenho delas no gerenciamento de questões ligadas à mudança climática. 

Como a preocupação com a devastação da Amazônia pressiona essa mudança? Em 2019, um comunicado do PRI enviado ao governo gerou bastante repercussão.

O desmatamento na Amazônia envolve diversas questões. Se considerarmos que o discurso mais ideológico é um forte componente de parte da equipe do governo atual, o assunto fica ainda mais complexo. No ano passado, o PRI coordenou uma manifestação de investidores conclamando o setor privado a implementar mecanismos de monitoramento em suas cadeias, para diminuir os riscos. Este ano, um grupo de quase 40 investidores enviou ao governo brasileiro uma carta com uma lista de pontos críticos para que seus investimentos não fiquem expostos a riscos reputacionais, operacionais e até legais. O setor privado tem evoluído. No entanto, o governo brasileiro precisa fazer cumprir a lei e recuperar a capacidade operacional dos órgãos de fiscalização no combate ao desmatamento.

A tarefa de engajar investidores nas questões de sustentabilidade está avançando? Quais são os progressos?

Sim, sem dúvida. O número de eventos virtuais ligados às questões ESG desde o início da pandemia é um indicativo. Destaco o aumento do número de signatários do PRI no Brasil, de 20% ao ano nos últimos dois anos (devemos fechar o ano com mais de 70 signatários) e a maior oferta de produtos financeiros sustentáveis, desde green bonds ao investidor institucional até fundos ESG ao cliente do varejo. Entre os signatários do PRI, há um aumento da exigência da divulgação dos impactos financeiros relacionados ao clima, alinhada à TCFD [Força-Tarefa sobre Divulgações Financeiras Relacionadas ao Clima]. Isso força o signatário a incluir essa questão nos seus processos de análise. O mesmo se dá às questões de impacto e contribuição com os ODS. Destaco também o anúncio importantíssimo do Banco Central em 8 de setembro que, entre outras medidas, prevê a obrigatoriedade da adoção da TCFD pelos bancos a partir de 2022. Isso vai provocar um efeito cascata no sistema financeiro como um todo, aumentando ainda mais o engajamento do investidor.

Na pegada da transparência

A história da Insecta começou com a paixão da empreendedora Barbara Mattivy por roupas antigas e lojas de segunda mão. Ela tinha um brechó online, mas não sabia o que fazer com algumas peças que precisavam de ajustes, até que uma amiga designer de calçados propôs utilizar aqueles tecidos para a produção de uma linha de sapatos, colocando em prática o conceito do upcycling, que agrega valor ao produto reciclado. Hoje, o carro-chefe da empresa são produtos feitos com a reutilização de roupas vintage, garimpadas em diferentes locais, e tecido ecológico feito com PET reciclado. O solado é feito de borracha reaproveitada e o restante dos materiais utilizados são sobras da indústria calçadista. 

 “A moda descarta uma quantidade enorme de materiais todo ano, então reaproveitar e ressignificar esses itens é uma obrigação para mim, no papel de empreendedora. Desde o início da empresa, tenho a missão de causar um impacto socioambiental o mais positivo possível, e é para isso que trabalhamos”, diz Mattivy Além do uso de materiais, a Insecta Shoes também inovou ao dar transparência para os custos envolvidos na fabricação de seus calçados, expostos no site da marca – lá, é possível saber quanto cada item (custo de produção, margem de lucro, impostos, entre outros) pesa no preço final do produto. 

Esse nível de transparência, raro no mercado brasileiro, agrada o consumidor da marca, que sabe exatamente o que está pagando. Também promove, em seu site e mídias sociais, conteúdos voltados a espalhar um estilo de vida mais sustentável.

De acordo com Mattivy, ser transparente nunca foi um problema para a empresa, hoje certificada como empresa do   Sistema B, com duas lojas físicas, um e-commerce, uma equipe de 11 pessoas no Brasil e duas no Canadá, onde começou a primeira operação internacional. “Os problemas geralmente acontecem quando as empresas não são transparentes”, diz. “Nosso cliente tem consciência ambiental e valoriza comprar de uma marca que compartilha dos seus valores e, além disso, tem orgulho de usar um produto que é esteticamente do seu gosto e, ao mesmo tempo, não contribui para o impacto negativo da indústria da moda”, completa.