A urgência climática – conectada a desmatamento, escassez hídrica, crise energética e inflação – destaca-se no componente ambiental do ESG no País. Empresas e setor financeiro buscam mitigar riscos e aproveitar oportunidades em um horizonte curto para não acontecer o pior

Por Sérgio Adeodato _ Foto: YinYang/ iStock

Genebra, Suíça, setembro de 2009. O vaivém de funcionários no saguão daquele prédio de vidros verdes em estilo futurista sinaliza o protagonismo que o tema lá trabalhado alcançaria nas primeiras décadas do século. No edifício da World Meteorological Organization (WMO), o oitavo andar é a meca dos alertas científicos em torno do que hoje se configura como os maiores riscos ao planeta. Lá funciona a sede do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), na época já no noticiário pelo tom dos avisos sobre impactos ambientais, sociais e econômicos do aquecimento global que muitos se negavam a acreditar.

Os corredores guardam histórias desse longo caminho de cenários para um desafio que atualmente marca a vida dos negócios, desenhado desde o primeiro relatório científico da instituição, em 1990, como suporte à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática, realizada em 1992, no Rio de Janeiro, a Rio-92.

No terraço do prédio, a cafeteria com vista para os jardins da Organização das Nações Unidas (ONU) é propícia às conversas de bastidores e entrevistas inspiradoras para a reportagem Senhores do tempo (publicada no Valor Econômico), também baseada na 3ª Conferência Mundial sobre o Clima para a qual jornalistas de todo o mundo foram convidados para acesso a dados científicos inéditos, no Centro de Convenções da cidade. Naquele quente fim de verão europeu, o indiano Rajendra Pachauri, então presidente do IPCC, deixara claro: “Não queremos empurrar nada para baixo do tapete”. E adverte: “O tempo é curto: adiar a ação só aumenta o problema”.

De Genebra, o grupo de jornalistas emite carbono nas viagens de avião e terrestres para conhecer impactos já sentidos no mundo: das montanhas de neve que derretem em Chamonix, na França, ao avanço do Deserto do Saara, no Mali, África. Tudo na expedição reforça o futuro sombrio das projeções feitas pelos relatórios, em torno do derretimento completo de geleiras no Ártico até 2020 e perda anual de gelo na Antártica igual a seis lagos da Usina de Itaipu. Os impactos do clima para a indústria de seguros já eram estimados em US$ 41 bilhões anuais na década seguinte.

Manter o carbono em nível seguro de temperatura custaria entre US$ 500 bilhões e US$ 1 trilhão por ano. Para isso, o antigo cálculo era de que, anualmente, os países ricos deveriam repassar aos menos desenvolvidos entre US$ 500 bilhões e US$ 600 bilhões, acima do que havia sido previsto pelo Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas. Erros ou acertos de projeções à parte, o investimento em informação climática evoluía como caminho para gerir riscos e perceber as oportunidades da mudança do clima.

Passaram-se 12 anos, e agora o mundo se vê diante do sexto relatório de avaliação do IPCC – sigla não mais restrita ao gueto de cientistas e ambientalistas. São mais de 3,5 mil páginas, 50 só de resumo executivo, com conteúdo mais claro e robusto sobre os impactos dos eventos climáticos extremos já em curso no planeta, e um atlas interativo que deixa a informação mais próxima de cada um.

Qual o orçamento de carbono necessário para que os serviços prestados pelo sistema climático não entrem em colapso? Em síntese, como preconiza o Acordo Climático de Paris, se não quisermos ir além de 1,5 grau de aumento da temperatura desde o período pré-industrial, é necessário limitar o carbono a 480 gigatoneladas até 2050. Isso exige zerar as emissões em 12 anos – cenário que deverá mobilizar as negociações na conferência climática de Glasgow, em novembro, para a adoção de novos instrumentos e compromissos capazes de evitar o pior.

A diferença em relação aos demais alertas é que, agora, o mundo das finanças está na corrida contra riscos que adquirem feições sistêmicas e colocam as economias globais em perigo, com curto horizonte de tempo para reagir. No esteio do movimento de investidores para mudanças no fluxo de capital, o boom ESG (critérios ambientais, sociais e de governança, na sigla em inglês) influencia o contexto da produção e do consumo, e tem no aspecto ambiental a mudança climática e a crise hídrica como principais desafios.

Mudança no fluxo de capital?

Os riscos ameaçam a retomada econômica no mundo pós-pandemia. “Faltam velocidade e ambição: como sociedade, estamos muito aquém dos investimentos necessários e precisamos de esforço imediato”, adverte Laura Albuquerque, gerente de finanças sustentáveis da WayCarbon.

Dos US$ 2 trilhões a US$ 4 trilhões por ano estimados para a transição, segundo a Climate Policy Initiative, o patamar está em US$ 1 trilhão. “Há uma grande lacuna na substituição do modelo tradicional e o atual movimento é tardio”, afirma Albuquerque. Ela vê capacidade de reduzir consideravelmente o impacto da mudança do clima, pelo menos para escapar do pior dos cenários, além dos 2 graus de aquecimento. “Já temos os custos financeiros da redução de carbono e precisamos acelerar de modo que os da adaptação aos impactos não se somem de forma imediata”, enfatiza.

Em sua análise, é preciso barrar os investimentos em carvão e petróleo e, no Brasil, estancar o desmatamento, permitindo que diferentes setores embarquem de forma mais efetiva no baixo carbono. “Mas temos um abismo completo de visão de política pública”, diz.

De acordo com a Global Landscape of Climate Finance Initiative, em 2018 os investimentos em atividades renováveis representaram US$ 300 bilhões, um terço do destinado ao carvão, óleo, gás e demais cadeias fósseis na energia, que somaram US$ 900 bilhões. O estudo, realizado a cada dois anos, deverá mostrar novos dados neste ano, sob o efeito da pandemia, dos compromissos net zero e de novas regulações do mercado financeiro. Entre 2015 e 2018, enquanto o investimento fóssil reduziu entre US$ 100 milhões e US$ 150 milhões, nas fontes renováveis o crescimento não ocorreu na mesma proporção.

O Network for Greening the Financial System (NGFS) articula bancos centrais do mundo para regulações alinhadas à ciência e apoio à transição para o baixo carbono, mas levantamento do BankTrack mostra que a maioria permanece na contramão. E carrega junto os bancos privados, com o paradoxo que concilia operações fósseis nas carteiras à expansão no lançamento de títulos verdes, conforme dados do Green Bonds Transparency Platform.

Os holofotes diferenciam o joio do trigo, pois instituições financeiras podem utilizar o capital como combustível para incêndios florestais e violações de direitos humanos, ao liberar crédito ou investir em empresas sem exigir o mínimo de critérios socioambientais ou promover engajamento (leia mais em “O Mundo das Finanças Acorda”, a seguir). Segundo o Guia dos Bancos Responsáveis, instituições financeiras da Holanda, Alemanha e Noruega investem quase R$ 60 bilhões em empresas que contribuem com desmatamento no Brasil.

Nessa toada, o banco de dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) mostra que os US$ 336 bilhões alocados para medidas de recuperação ambientalmente positivas no cenário da pandemia são quase igualados por medidas não verdes, considerando-se iniciativas de valor monetário. Metas de emissões líquidas zero em 2025 estão ganhando terreno no G20, as 20 maiores economias do mundo, mas cerca de 54% do suporte dado por esses países ao setor de energia foram direcionados para combustíveis fósseis, em 2020.

Grandes corporações intensivas em carbono, como as de cimento e siderurgia, investem em mudanças de processos produtivos, mas ainda com baixa escala nas operações próprias e inexpressivo avanço nas cadeias de pequenas e médias empresas, desprovidas de conhecimento técnico e compromissos ambientais. “As transformações dependem do nível de pressão de investidores”, observa Albuquerque. Com um detalhe: “Não tem como o setor financeiro atuar se o órgão regulador não fiscalizar e os governos não estiverem alinhados no mesmo objetivo”.

O mito da desmaterialização

Para Ricardo Abramovay, pesquisador sênior do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo, o lobby das atividades fósseis – em direção contrária à redução de emissões – tem um agravante adicional: “Está conseguindo inserir no Plano Biden tecnologias de captura de carbono de eficiência não comprovada, como feitiços que se voltam contra o feiticeiro”.

O professor lembra sobre o risco “tecnofatalista”, mencionado por Elizabeth Kolbert no livro A Sexta Extinção. E reforça que “vivemos no mundo que produz a ilusão da economia desmaterializada, mas apesar das lições da pandemia e da explosão do comércio online, o uso de materiais [com impactos ao planeta e ao clima] não está sendo reduzido”.

Segundo o International Resource Panel, ligado à ONU, em 20 anos a produção de materiais (aço, ferro, cimento, plástico e madeira) aumentou de 15% para 23% a participação nos gases estufa do planeta. Dois terços dos materiais são usados para produzir bens de capital, como estradas, edifícios e máquinas, enquanto o restante se destina a bens de consumo, como geladeiras e veículos.

O estudo aponta que as emissões de materiais de edifícios residenciais nos países ricos do G7 e China poderiam ser reduzidas em pelo menos 80% em 2050, por meio do uso mais intensivo, design com menos materiais, mais reciclagem de materiais de construção e outras estratégias. Reduções significativas, de até 70% nos países desenvolvidos, também poderiam ser alcançadas na produção, no uso e descarte de automóveis – em especial, por meio de caronas e compartilhamento de carros.

Segundo Abramovay, 60% das emissões de carbono provêm da instalação e operação de infraestrutura, e o mundo vai investir US$ 94 trilhões no setor até 2030, com alto impacto no orçamento climático. Em 2021, cada tonelada de cimento é produzida com emissões 18% menores do que três décadas antes, conforme trabalho do Carbon Brief. Neste período, porém, a demanda de cimento no mundo triplicou. E apesar dos avanços tecnológicos do setor, suas emissões continuam subindo.

“Qual deve ser o nível de mudança da mineração, siderurgia e produção de cimento para dar suporte aos padrões de consumo?”, pergunta o analista, com o alerta de que “a infraestrutura de hoje determina a mudança climática do amanhã”.

Em sua visão, o esforço climático está muito longe do necessário, por mais que haja compromisso para aumento de eficiência no uso de materiais. “Não vemos atitudes disruptivas”, aponta Abramovay. Ele observa sinais positivos neste sentido, como na mobilidade elétrica, que por sua vez depende de geração descentralizada e minerais para baterias. De igual forma, buscam-se mudanças na matriz de refrigeração e aquecimento. “Há empenho de governos e movimentos como o New Green Deal, mas é difícil uma transição desse tamanho, em prazo tão curto, entrar no horizonte de gestão das empresas”, ressalta o professor.

“A urgência da mudança climática não permite que o tema permaneça encarado como fator externo à vida econômica, mas como cerne da gestão pública e privada. Se não formos capazes de fazer escolhas orientadas pelas mensagens que o IPCC está transmitindo, o resultado é que simplesmente não haverá futuro”, analisa Abramovay, em recente artigo.

Em cenário assustador, a queima de combustível fóssil é a maior vilã: somente petróleo e gás correspondem a 42% de tudo que a economia global emite, e a lógica colocaria aí as principais estratégias de mitigação. Mas qual o esforço do setor para impedir a destruição do sistema climático? Praticamente zero, responde estudo da Agência Internacional de Energia indicando que mais de 99% dos investimentos das empresas de petróleo e gás são feitos em fontes sujas que elas já oferecem no mercado, com tendência de expandir produção.

Custos do não retorno

De acordo com relatório da Oxfam, a mudança climática terá mais impacto na economia global do que a Covid-19. Nos países ricos, será duas vezes maior, se os governos não frearem o aumento das emissões de gases de efeito estufa, com risco de perder 8,5% do Produto Interno Bruto (PIB) por ano, em média, até 2050 – algo equivalente a US$ 4,8 trilhões.

Em paralelo, análise da consultoria global McKinsey em determinados países encontrou o potencial de impacto socioeconômico de cerca de duas a 20 vezes até 2050, em relação aos níveis atuais. O estudo explica que os sistemas econômicos e financeiros foram projetados e otimizados para um certo nível de risco e que os perigos crescentes podem tornar esses sistemas vulneráveis, quando atingem limites sistêmicos.

As cadeias de suprimentos, por exemplo, são frequentemente projetadas para eficiência em vez de resiliência, concentrando a produção em certos locais e mantendo baixos níveis de estoque, aponta a análise. A produção de alimentos também está fortemente concentrada; apenas cinco regiões do mundo respondem por cerca de 60% da produção global de grãos. Segundo os pesquisadores, os riscos climáticos podem, portanto, colapsar o sistema se os principais centros de produção forem afetados.

Além disso, os custos econômicos de não agir serão maiores do que se imaginava, devido aos pontos de não retorno climáticos – quando as temperaturas superam limites críticos, levando a impactos acelerados e irreversíveis. O alerta é de estudo da London School of Economics, da University of Delaware e da New York University, indicando aumento de até 25% do prejuízo financeiro com os impactos, em comparação com projeções anteriores. Na Amazônia, o quadro levaria à perda de um quarto da floresta tropical, o que alteraria drasticamente o regime de chuvas na América do Sul – e, principalmente, no Centro-Sul do País, celeiro do agronegócio.

Em cenários menos conservadores, a pesquisa indica 10% de chance de os custos dobrarem, e as perdas ocorreriam em quase todos os lugares do mundo, incluindo estimativas sobre danos climáticos pela elevação do nível do mar em 180 países, degelo e alterações na circulação atmosférica. De acordo com o estudo, oito pontos de inflexão até hoje modelados na economia do clima afetam as temperaturas ou o nível do mar de diversas maneiras.

Um desastre relacionado ao clima ou à água ocorreu todos os dias, em média, nos últimos 50 anos, com perdas de US$ 202 milhões diários, de acordo com novo relatório da Organização Meteorológica Mundial (OMM). O número de ocorrências aumentou cinco vezes em cinco décadas, devido a condições climáticas extremas, e graças à gestão de alertas precoces as mortes diminuíram quase três vezes. Segundo o Atlas de Mortalidade e Perdas Econômicas da WMO, entre 1970 e 2019 houve mais de 11 mil desastres, com pouco mais de 2 milhões de mortes (91% dos países em desenvolvimento) e US$ 3,64 trilhões em prejuízos.

Estudo realizado em 48 países em desenvolvimento indica que 25% dos danos advindos de desastres naturais ocorridos entre 2003 e 2013 recaíram sobre a agropecuária, causando prejuízos de US$ 70 bilhões. Estima-se que 44% dessas perdas foram causadas por secas e 39% por enchentes.

No Brasil, os danos causados pelo clima à economia foram de R$ 168,2 bilhões, entre 2010 e 2019, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Cerca de 46 milhões de pessoas foram afetadas por chuvas intensas e alagamentos, com perdas de R$ 30,7 bilhões. E as secas causaram impacto ainda maior: 212 milhões de habitantes e estrago econômico de R$ 132,7 bilhões. Na agricultura brasileira, análises da Embrapa evidenciam perda anual próxima de R$ 11 bilhões (1% do PIB agrícola), devida a eventos extremos. E a tendência é de aumento, em função do baixo nível de mitigação das emissões de carbono em nível global.

Reação tímida

Cresce o número de investidores procurando empresas mais maduras na questão climática, porém sem o desapego dos investimentos em setores intensivos em carbono pela expectativa de retorno de curto prazo. Na visão de Laís Cesar, gerente de mercado de capitais do CDP, organização que processa dados ambientais de empresas e governos na análise de risco para a decisão de investimentos, “a busca de informações tem sido mais criteriosa, porém em apenas 25% dos relatos que recebemos os investidores fazem análise das emissões financiadas”.

Isso significa que apenas uma pequena parte sabe ao certo quanto o seu capital contribui para o carbono das atividades produtivas apoiadas com finalidade de retorno financeiro. Essas emissões externas, incluindo as cadeias de fornecedores, são cerca de 700 vezes superiores ao impacto operacional interno das empresas, segundo estimativa da gerente.

Segundo ela, a grande discussão do momento é sobre qual é a melhor estratégia: desinvestir na empresa intensiva em carbono ou atuar junto com ela para construir metas e reduzir emissões. “Se houver um plano, com compromissos e perspectiva de maior valor agregado no futuro, a opção do investidor é agir de forma mais próxima com a empresa”, afirma. Em alguns casos, a interferência se dá pelo engajamento corporativo, por meio do direito de voto nas assembleias, como no recente caso da petroleira Shell, em que os acionistas votaram contra novos investimentos intensivos em carbono e solicitaram um plano de transição, conta.

Setores como tabaco e armas, segundo ela, já estão sendo retirados das carteiras por não terem perfil ESG, mesmo que apresentem plano de baixo carbono. No total, 49% das instituições financeiras que reportaram dados ao CDP e conhecem as emissões financiadas têm planos de reduzi-las – a exemplo da CalPERS, fundo de pensão de funcionários públicos da Califórnia (USA) que tem portfólio de US$ 392,5 bilhões, investe aproximadamente US$ 43,6 bilhões em empresas e projetos da região e elabora metas anuais para zerar emissões de carbono até 2050.

Há, porém, fundos de pensão que caminham na direção contrária e alimentam a destruição da Amazônia em nome da aposentadoria de médicos e professores estrangeiros, como neste levantamento da Forests & Finance.

No Brasil, o barulho aumenta. “É como uma avalanche, e estamos no meio dela”, compara Viviane Torinelli, pesquisadora da Universidade Federal da Bahia e integrante da Brasfi, rede de pesquisa em finanças sustentáveis com 60 membros. Como um efeito-dominó, a mudança climática está associada à crise hídrica, que por sua vez afeta a geração de energia, a produção de commodities agrícolas e a inflação, demonstrando as conexões com o desenvolvimento econômico e os desafios sociais. “A emergência da transição tem chacoalhado a indústria de óleo e gás, com tendência de desvalorização de ações no mercado sob o risco de exposição sistêmica da economia a impactos climáticos”, afirma Torinelli.

Ela lembra que agências internacionais de rating começam a adotar novas lógicas de impacto econômico, levando em conta fatores como desmatamento, o que produz potenciais efeitos negativos para o valor de frigoríficos brasileiros, com efeito cascata no mercado. De acordo com Torinelli, globalmente, o apelo ESG movimenta também a cooperação bilateral para acesso a crédito e mercados com diferencial competitivo, antecipando-se a exigências regulatórias com aumento de custos.

Em sua análise, o ritmo mais rápido virá principalmente de dois lados: da remuneração de executivos com olhar de futuro e não de resultados em cinco anos como no modelo tradicional de negócios; e do esforço regulatório sobre o fluxo de capital, com a definição de como será controlado e reportado (leia mais nesta reportagem sobre governança).

“Os bancos têm o desafio de enxergar diferente o que antes era feito apenas por compliance, cultivando a percepção da relevância do tema ambiental e social como materialidade financeira para a tomada de decisões de médio prazo, quando já vemos os impactos acontecerem no curto prazo”, aponta a pesquisadora.

Embora em dimensão desproporcional à emergência climática, as finanças verdes deixam de ser um nicho e começam a se tornar dominantes por trás da transição energética global. De acordo com o Global Sustainable Review, os ativos de investimentos sustentáveis subiram de US$ 22,8 trilhões, em 2016, para US$ 30,6 trilhões, em 2018. Em 2020, atingiram US$ 35,3 trilhões, totalizando 35,9% do total de investimentos no mundo.

Orçamento apertado

O planeta conseguirá gastar o que pode de carbono até 2050? Com quais consequências? “Precisamos de uma curva exponencial de redução, pelo menos para não superar o limite de segurança dos 2 graus de aumento, e quem não abraçar o objetivo agora pode não alcançar depois, porque as tecnologias serão caras”, destaca Johannes van de Ven, diretor-executivo da Good Energies, na Suíça.

Pelas suas contas, para o planeta ficar abaixo de 1,5 grau de aquecimento, o orçamento de carbono se esgotará em sete anos, caso os atuais níveis de emissão (40 bilhões de toneladas ao ano) se mantenham. Diante do quadro, é crescente a pressão internacional por uma virada de chave: três quartos da população mundial defendem maior poder da ONU para acelerar a mitigação, com a instalação de uma espécie de Conselho de Segurança Climática. Além disso, monitorar riscos climáticos é uma agenda já permanente em mercados como o europeu, e as consequências recaem nas empresas globais.

A Comissão Europeia, por exemplo, propõe implantar o Carbon Border Adjustment Mechanism: a taxa que penalizará quem importar carbono embutido em produtos oriundos de países com regras ambientais frouxas – a começar pelo ferro e aço, cimento, fertilizante, alumínio e geração da eletricidade. Projetada em conformidade com as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), a medida é vista como estratégica para a Europa atingir a meta de reduzir 55% das emissões, comparáveis a 1990, e tornar-se um continente neutro para o clima até 2050. Outras regiões, como o estado da Califórnia (EUA), Canadá e Japão, planejam iniciativas semelhantes.

Segundo Ven, no ferrolho das regulações que estão por vir globalmente existe o debate no sentido de que os reports de sustentabilidade se tornem obrigatórios, como ocorre no mundo da contabilidade financeira, apresentando desempenho ambiental e balanço de metas climáticas auditáveis, baseadas em padrões únicos globais.

Mais de 1,7 mil empresas já aderiram ao sistema da Science Based Targets initiative (SBTi), em que submetem metas climáticas à avaliação e aprovação, para alinhamento ao Acordo de Paris, no horizonte das emissões líquidas zero. E agora, de acordo com Ven, países europeus cogitam exigir o selo como condição para empresas constarem nos índices das bolsas de valores.

“Há, ainda, a tendência de o modelo ser aplicado também no tema da biodiversidade, do uso da terra e de recursos hídricos, o que seria muito importante para o Brasil monetizar a floresta como sumidouro de carbono, com maior suporte e segurança para investimentos”, aponta o analista.

Segundo ele, o desafio imposto à fonte solar há 20 anos se repete agora, por exemplo, com o carbono florestal: “um ativo valioso que está inspirando a estruturação de fundos verdes nos vários continentes”, na lógica de reduzir gases estufa e, também, removê-los da atmosfera, conservando floresta e recuperando ambientes degradados.

Ele enfatiza que, “para o imaginário do mundo, a Amazônia é muito mais que Brasil”, e assim deve ser remunerada. “Um hectare de floresta primária valerá mais do que a mesma área de soja para alimentar porcos na China”, prevê.

Riscos para seguradoras

“ESG é um sinal, não um barulho: pelo bem ou pelo mal, a mudança climática já mexe com preços de mercadorias e ativos; as regulações de governos seguem acelerando e o mercado financeiro se movimenta para não ficar com ativos sem valor na mão”, analisa Ven. Diante dos riscos climáticos, os preços das apólices de seguro estão cada vez mais altos, e a tendência é excluir dos portfólios atividades intensivas em carbono. “Das perdas de US$ 82 bilhões com inundações em 2019 no mundo, apenas US$ 13 bilhões estavam segurados”, afirma.

Os mercados financeiros podem antecipar o reconhecimento de risco nas regiões afetadas, com influência na realocação de capital. A multinacional SwissRe estima aumento de 30% de sinistros para as resseguradoras. Como forma de conscientizar agentes e influenciar clientes a reduzir risco climático, a companhia colocou o carbono no custo das operações internas, no valor inicial de US$ 100 por tonelada de CO2 para cada funcionário. “Não basta comprar apólice contra desastres; é preciso reduzir emissões e regenerar o planeta”, adverte Ven. No Brasil, a Superintendência de Seguros Privados (Susep) prevê critérios socioambientais no plano de regulação de 2021.

Caso as emissões de gases de efeito estufa sigam em elevação nas atuais taxas, a temperatura do planeta poderá aumentar 5,4 graus até 2100, e ninguém estará imune aos graves impactos econômicos e sociais, segundo o IPCC. “O susto será nosso caminho: estamos aprendendo sobre mudança climática já olhando para as catástrofes”, lamenta Celso Lemme, professor da Coppead, na Universidade Federal do Rio de Janeiro. “É urgente começar de alguma forma e ir ajustando; o que não podemos é nos acomodar na inércia”, afirma.

No cenário em que o desembarque de capital para o baixo carbono tem sido muito inferior ao necessário, “a boa notícia é que há muito espaço de oportunidades para evoluir”. Para Lemme, falta consciência da emergência e o ESG ainda se apresenta muito modesto como estratégia de investimento, no Brasil. Mas há sinais de avanços no mercado financeiro, como o anúncio da nova linha de crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no total de R$ 1 bilhão. O valor se destina ao fomento de empresas que se comprometam a melhorar indicadores de sustentabilidade nos setores de reflorestamento, equipamentos para a cadeia de energia renovável e eficiência energética, mineração e siderurgia, com redução de juros.

“A iniciativa poderá ter efeito indutor para disseminar práticas em segmentos estratégicos da economia”, prevê Lemme. No entanto, ele ressalva: “Criar o instrumento é um ponto; operacionalizá-lo, é outro”. A reportagem da Página22 procurou o banco para saber as metas, as expectativas de resultados e o potencial de mudanças no fluxo de capital ainda revertido para setores intensivos em carbono, mas não obteve resposta.

Crescimento na Bolsa de Valores

Em setembro, o BNDES obteve rating ESG entre os 2% das companhias mais bem avaliadas pela agência Vigeo Eiris, controlada pela Moody’s. No entanto, a análise sugeriu melhorias, ao ressaltar que o banco não monitora as emissões de carbono da sua carteira de crédito, além de não ter indicadores de performance e metas socioambientais.

Na visão de Lemme, o atual momento não é de apenas buscar caminhos, mas fomentar, melhorar as escolhas. “Antes, as questões ambientais eram vistas como fatores que desviavam o foco financeiro, no conceito do dever fiduciário, alinhado aos princípios dos donos do capital. Mas agora há uma nova lógica que influencia regulação e comportamento do mercado e dos preços”, explica o pesquisador.

Não à toa, o mercado de green bonds está superaquecido. Em 2015, havia apenas um título verde rotulado no Brasil, no valor de US$ 549 milhões. Em 2021, são 73 operações, no total de US$ 11 bilhões, e o que começou no setor de energias renováveis, agora abrange projetos no agronegócio e florestas. A reboque replicam variantes como o sustainability-linked bond, com uso do capital vinculado a metas de desempenho na área ambiental, social e de governança. Já os diaspora bonds permitem países em desenvolvimento obterem ajuda de expatriados em nações ricas.

Cresce a percepção sobre conexões entre sustentabilidade e produtividade, perenidade do negócio e ganho de imagem, com reflexo na remuneração de capital. Em 2020, foram criados 85 fundos rotulados como sustentáveis no Brasil, contra apenas seis no ano anterior, segundo a Morningstar. Segundo dados divulgados recentemente por Fabio Zenaro, diretor de novos negócios da B3, no Congresso da Associação Brasileira do Agronegócio, existem 39 empresas no Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), em reformulação para adotar novos critérios. Além disso, há 62 ações de 58 companhias no Índice de Carbono Eficiente (ICO2), sem falar de 24 debêntures e outros títulos ligados ao tema.

No entanto, analistas identificam universos paralelos entre atores que promovem investimentos verdes, com desencontro de visões sobre o que poderia ser considerado green. É o caso do polêmico projeto da Ferrogrão, defendido pelas empresas do agro e contemplado pela Climate Bonds Initiative como um potencial emissor de títulos verdes, mas que está sendo questionado pelo Tribunal de Contas da União, e também no Supremo Tribunal Federal, com diversas manifestações contrárias apresentadas pela academia, por advogados, organizações da sociedade civil e pelo movimento indígena.

Precificação do carbono

Colocar preço no carbono é uma forma de incentivo à mitigação e punição para quem não se mexe. Existem 61 iniciativas globais de regulação neste sentido, cobrindo 22% das emissões globais, conforme levantamento internacional. Apesar da evolução lá fora e das tratativas entre setor privado e governo federal, o Brasil tem caminhado devagar na discussão do marco regulatório de carbono, com expectativa de aprovação no Congresso Nacional antes da COP 26, a ser realizada no começo de novembro, após a busca de consenso entre indústria pesada e setores mais progressistas.

Neste ano, o Brasil foi excluído do Program for Market Implementation, do Banco Mundial, pela falta de avanços consistentes no tema. Desta forma, o País não terá cooperação para desenhar a política de regulação, ficando atrás de Colômbia, México e Chile. “Não basta um governo dizer que é pró-mercado de carbono ou outros genéricos. Precisa mostrar interesse, disposição e ação verdadeira quanto a regular emissões em sistema de preços”, afirma Natalie Unterstell, presidente do Talanoa – Instituto Internacional de Políticas Públicas. “Não temos política pública para a questão climática; o único que existe é um declarado apoio ao mercado voluntário de carbono, que não resolve o problema, e nem é tema da COP 26”, completa.

Unterstell lembra que o governo brasileiro está dedicado a criar um enorme estande na conferência do clima como sinal de comprometimento, mas de objetivo levará um plano de implementação da indústria brasileira, embora conter o desmatamento seja o cerne dos compromissos nacionais [a Intended Nationally Determined Contributions (INDC)] no Acordo de Paris. “A política climática está restrita a um pavilhão de exposição”, diz.

Segundo ela, a Força-Tarefa sobre Divulgações Financeiras Relacionadas ao Clima (TCFD), criada pelo Conselho de Estabilidade Financeira Internacional, tem pedido a descarbonização real da economia. “Estamos atrasados e o mercado financeiro não é capaz de agir sozinho sem políticas públicas contra a grilagem e o desmate”, enfatiza Unterstell. Ela lembra o combo de projetos legislativos que estão para ser votados com mais retrocessos no Congresso Nacional: “Estamos no limiar de pactuar de vez com a continuidade dos problemas e será difícil reverter lá na frente”.

Gustavo Pimentel, diretor da Sitawi, concorda: “O que falta neste momento é senso de urgência aos tomadores de decisão no âmbito político; a tolerância do setor privado e da sociedade civil ao não posicionamento diminuiu”. Em recente seminário sobre o tema, ele reforça que a linha dessa relação historicamente conservadora mudou e que todos precisam se adaptar porque há pressão por todo lado. “Precisamos falar mais em como votar, porque a participação política não é algo menor para construir o mundo que a gente quer”, afirma.

Para Leonardo Letelier, fundador e CEO da organização, o setor privado pode e deve fazer muito, porém precisa ser mais verdadeiro. “Não adianta mudar a tipografia da fonte para verde e já se dizer que é sustentável”, diz. Ele pergunta se apenas o investimento de capital com expectativa de retorno trará os benefícios ambientais e sociais necessários: “O ESG vai mudar o mundo? Sairemos do nicho ou criaremos uma bolha de expectativas?”.

Biodiversidade na agenda

Na interface com o clima, a biodiversidade é ponto de atenção na agenda brasileira de ESG. De acordo com o WWF, o planeta está perdendo espécies entre 1 mil e 10 mil vezes acima da taxa de extinção natural.

O problema coloca em xeque não só o equilíbrio ecológico e a qualidade de vida, mas o patrimônio genético e a disponibilidade de recursos naturais e matérias-primas aos setores econômicos, com reflexos nos resultados financeiros. Estudo do Fórum Econômico Mundial aponta que o mundo investe 10 vezes menos do que o necessário para compensar impactos e recuperar minimamente o planeta. As soluções, com efeitos paralelos no abrandamento da crise climática, custariam 0,13% do PIB global – em três décadas, seriam US$ 8,1 trilhões à agricultura regenerativa, à recuperação de florestas, ao controle da poluição e à conservação de áreas protegidas. Para analistas, os recursos viriam do capital hoje empregado no uso insustentável do planeta, mas esse deslocamento não é simples.

A Força-Tarefa sobre Divulgações Financeiras Associadas à Biodiversidade está construindo as bases para os relatos desses riscos até 2023, permitindo que instituições financeiras e empresas gerenciem impactos das carteiras para mudanças no fluxo de capital, com resultados positivos para a natureza. No Brasil, gestores de fundos e organizações como o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (Cebds) e a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) estão engajados na agenda, voltada a entender a correlação de riscos entre biodiversidade e operações de setores como agrícola, de mineração e de papel e celulose.

O cenário político no País eleva a régua do problema, porque o mercado financeiro fica refém da falta de fiscalização ambiental. Há baixa transparência e faltam bases de dados públicos nos estados. O desmatamento na Amazônia cresceu 57% entre agosto de 2020 e julho de 2021. Foram 10,4 mil quilômetros quadrados, território seis vezes maior do que a cidade de São Paulo. Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), neste ano, até 13 de setembro, ocorreram mais de 107 mil focos de queimadas no País, quase metade no bioma amazônico, que pode estar à beira da destruição funcional, conforme recorrentes alertas da ciência.

Vilões brasileiros

Enquanto no mundo o consumo de energia (transporte, eletricidade e geração de calor) é de longe a maior fonte de emissões de gases de efeito estufa, responsável por 73% do total, no Brasil o principal fator está na mudança de uso da terra e florestas, com 44% do que é emitido no País – o que sinaliza o caminho das prioridades na agenda ESG, passando necessariamente pela Amazônia.

“Há necessidade urgente de um novo modelo econômico, combinando conhecimento tradicional ao científico, com restauração de floresta e remoção de carbono, em benefício das populações locais”, afirma o climatologista Carlos Nobre, do Instituto de Estudos Avançados da USP. “Para salvar a Amazônia, precisamos em curtíssimo prazo zerar o desmatamento, que já atingiu 1 milhão de quilômetros quadrados, e a degradação, em curtíssimo prazo”, reforça.

Em quase 50% da Bacia Amazônica, os períodos de secas estão mais longos, e recentes estudos científicos apontam que, em algumas áreas, a floresta está passando de sumidouro para emissora de carbono. “Podemos estar muito próximos do ponto irreversível”, diz o cientista.

Pesquisas indicam que o desmatamento não traz aumento de renda. Ao contrário, destrói o patrimônio essencial ao desenvolvimento de uma bioeconomia e alimenta atividades ilegais e impactos sociais, ligados ao crime organizado. Entre agosto de 2018 e julho de 2019, 38% da exploração madeireira no Pará não foi autorizada. Além disso, os garimpos – e seus impactos socioambientais – já representam quase dois terços das atividades de mineração na Amazônia, segundo estudo do MapBiomas. Estudo do Instituto Escolhas lançado em agosto mostra que, em 2020, o Brasil exportou 111 toneladas de ouro, 19 delas sem registro de origem ou autorizações.

Impactos no agronegócio

No Brasil, as áreas agrícolas cresceram três vezes entre 1985 e 2020. As de pastagem, 39%. No mesmo período, o País perdeu 82 milhões de vegetação nativa, igual a 3,5 vezes o tamanho do estado de São Paulo. E os efeitos na mudança climática chegaram a níveis críticos. “Desde 2016 as emissões brasileiras triplicaram e nada aconteceu para resolver, apesar dos relatórios do IPCC. O tempo está ficando cada vez mais curto e é inacreditável em 2021 existirem céticos divulgando falácias. O País está vulnerável e não somos ouvidos”, ressalta Eduardo Assad, pesquisador da Embrapa que acompanha as modelagens de impactos climáticos na agropecuária desde 2004.

Já ocorrem mudanças na distribuição de temperatura e chuvas: “Setores produtivos como o de café e laranja estão muito preocupados e buscando soluções”, revela Assad, em recente debate na Fundação Getulio Vargas. No veranico de 2018-2019, as perdas na soja foram de R$ 15 bilhões no Paraná e Rio Grande do Sul. No atual momento, em 2021, devido a fatores climáticos, a produtividade do milho caiu 25,7%.

Além de emitir gases de efeito estufa, a agropecuária é altamente sensível à mudança climática, o que exige não só estancar o desmatamento, como implantar novos cultivares, genes e sistemas produtivos, como a Integração Lavoura, Pecuária e Floresta (ILPF), para amenizar danos e suprir a demanda de matérias-primas e alimentos no mundo. Uma estratégia é intensificar a produção por meio da restauração de 15 milhões de hectares de pastagens degradadas e pelo incremento de 5 milhões de hectares de sistemas de ILPF até 2030, em linha com o Plano ABC (Agricultura de Baixa Emissão de Carbono).

No agronegócio, responsável por 25% do PIB brasileiro, há também o desafio de maior rastreabilidade das cadeias produtivas, em especial da carne, inclusive como critério para liberação de crédito pelos bancos que buscam metas ESG em suas carteiras (leia mais em “Plano Amazônia, um ano depois”, a seguir).

Siderurgia em xeque

Devido ao desmatamento, o “risco Brasil” mancha a imagem de setores econômicos com potencial prejuízo no comércio internacional, em especial das principais indústrias emissoras de gases estufa: mineral, cimento, aço e papel e celulose, que alega capturar carbono pelas árvores e reivindica benefícios por isso.

A siderurgia figura entre as atividades que mais precisam reduzir pegada climática: cada tonelada de aço produzida em 2018 emitiu em média 1,85 toneladas de dióxido de carbono, o que equivale a cerca de 8% das emissões globais. Na incapacidade de reduzi-las, as empresas do setor podem perder 14% do valor, segundo análise da McKinsey. O risco levou uma rede global com mais de 250 investidores e US$ 30 trilhões em ativos sob gestão a olhar com maior atenção para o que faz a indústria siderúrgica em face da mudança climática.

Globalmente, o setor está longe de cortar 91% nas emissões até 2050 para atingir o net zero, conforme prevê a AIE. No Brasil, o aço – altamente dependente do carvão mineral – representa a maior emissão de gases de efeito estufa do segmento industrial, com 43% do total, acima do cimento (20%). São 61 milhões de toneladas de carbono por ano, inferiores à média global, havendo pouco espaço tecnológico para maior redução, segundo análise do Instituto Aço Brasil, que iniciou a busca de soluções e a estruturação de governança climática. Substituição de fontes fósseis, uso de resíduos e eficiência energética são caminhos às vezes dificultados pela falta de políticas públicas.

Uma rara iniciativa, o Programa para Uso Sustentável do Carvão Mineral Nacional, anunciado neste ano pelo governo federal, causou polêmica. Um manifesto assinado por nove ONGs brasileiras criticou o plano de ir na contramão da ciência e dos esforços globais em favor da redução do uso dos combustíveis fósseis. E classificou o dito “carvão mineral sustentável” como “a nova cloroquina do setor elétrico”, destinada a perpetuar-se na matriz energética de modo antieconômico, com impactos sociais aos trabalhadores.

Tecnologias para prevenir

Nas atividades econômicas associadas às mudanças do uso da terra, há o desafio de tropicalização de métricas para suporte a ações de governo e análise de riscos ESG por empresas e mercado financeiro, no contexto da realidade brasileira. Na transformação digital, a inteligência artificial integrada a imagens de satélite escancarou os impactos à natureza, sem que hoje seja possível escondê-los. E agora uma novidade chega aos sistemas que monitoram a Amazônia: a PrevisIA, plataforma de dados que tem o diferencial de não olhar apenas para trás, mas de prever riscos futuros de desmatamento, no horizonte de 12 meses.

“O pulo do gato é entender o que poderá acontecer no curto prazo, em função de diversas variáveis, como PIB, população, uso da terra, distância para estradas e existência de áreas protegidas”, explica Carlos Souza, pesquisador do Imazon.

A vantagem do novo paradigma é prevenir o desmatamento antes que ocorra, de modo a agir antecipadamente no controle e planejar investimentos privados sem riscos de financiar a destruição. “Ao evitar a derrubada de floresta, o sistema dá segurança a operações com crédito de carbono, gerando recursos para a região”, acrescenta Souza. Em 2020, o mercado voluntário de carbono movimentou globalmente US$ 600 milhões, com previsão de crescer 30% neste ano, no rastro das pressões por neutralização de gases de efeito estufa.

Com cerca de R$ 1 milhão do Fundo Vale, Microsoft e outros parceiros, a plataforma está sendo testada pelo Ministério Público do Pará, na região de Altamira (PA), com planos de aplicação visando a eficiência de embargos e o suporte de compromissos empresariais net zero, como na cadeia da pecuária.

“É possível identificar zonas livres de desmatamento e saber onde comprar sem favorecer impactos”, observa o pesquisador, na esperança de que um dia os laudos técnicos para controle ambiental sejam emitidos automaticamente, com rapidez e segurança, igual como nas multas de trânsito. “Já estamos tecnicamente prontos”, diz Souza.

Na visão do pesquisador, a maior frequência e intensidade de crises devido à mudança climática obrigará a predição de riscos, com transparência e efetividade, para saber onde se deve colocar o dinheiro, inclusive como forma de incentivo para quem faz o certo, por meio de iniciativas como o Pagamento por Serviços Ambientais, que recompensa a manutenção de floresta para oferta de água. “O que vai acordar o Brasil pode não ser a mudança do clima, mas a crise hídrica e seus prejuízos financeiros imediatos”, prevê o pesquisador.

“É um momento importante na agenda de investimentos, agora liderada por quem era patinho feio da sala, redirecionando recursos para temáticas importantes para a humanidade”, ilustra Gilberto Ribeiro, sócio da Vox Capital. No entanto, argumenta ele, “sem uma reforma ampla no modelo econômico, não iremos para frente”.

A questão ambiental, centrada na crise climática, junta-se ao desafio da desigualdade com a concentração de renda. “A pandemia foi um choque de realidade para entender que o mundo está mais conectado do que achávamos e o senso de urgência do clima deve ser o mesmo, apesar do negacionismo que tangencia ambos”, analisa Ribeiro (leia mais nesta reportagem sobre o aspecto social). Com uma advertência: a demanda, segundo ele, abre oportunidades para oferta de soluções fáceis que não resolvem e não podemos legitimar quem quer salvar o planeta no aspecto ambiental com um dedo e com outro quer lucrar no esteio dos problemas de saúde e outras mazelas da humanidade.

“Investir em ESG não é uma métrica, mas um modelo mental por trás de gerenciar o negócio”, enfatiza Ribeiro, ao lembrar que possíveis incoerências não tiram o mérito da pauta. “A beleza está nesse diálogo”, acrescenta.

Em sua análise, há espaço para reforma, ainda que não seja uma revolução, mas o desafio é não repetir o playback antigo dos investimentos. “A mudança virá por meio de um dos três ‘C’: comunicação, conveniência ou coerção”, aponta. Ribeiro faz dele a recorrente fala do sócio, Daniel Izzo, sobre o “pragmatismo utópico” do escritor uruguaio Eduardo Galeano, em que a utopia está na linha do horizonte para fazer a gente caminhar. “Não dá para acabar com o petróleo agora, mas as finanças acharão a melhor governança no caminho do meio”, estima.

Ele aposta na força das instituições reguladoras, como a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Banco Central. E resgata o pensamento ortodoxo do economista turco-americano Daron Acemoğlu, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos EUA, autor de Por que as Nações Fracassam – influente livro sobre o papel que as instituições desempenham na formação de um país. Posteriormente, na obra O Corredor Estreito, o ortodoxo professor rendeu-se à força da liberdade individual como fruto da interação do poder do Estado com a mobilização da população em reivindicar pautas. Ribeiro conclui: “A agenda do desenvolvimento sustentável virá de algum corredor estreito entre quem detém o capital e a sociedade civil atuante”.

O Brasil de conta-gotas – fatores e consequências da crise hídrica

A realidade ambiental brasileira do ESG é marcada pela íntima relação entre desmatamento, mudança climática e crise hídrica, que neste ano secou os reservatórios de hidrelétricas e obrigou o acionamento das usinas a óleo e gás. O resultado: mais carbono na atmosfera e conta de energia elétrica mais cara. Não só. A escassez de chuvas, associada à mudança climática global, trouxe novamente o fantasma dos apagões e do racionamento de água nas cidades – e se replicou na inflação dos alimentos, prejudicando principalmente as camadas mais pobres da população.

Há térmicas operando de modo contínuo com custo de R$ 1.520 por megawatts-hora, extremamente alto se comparado com os R$ 100 por megawatt-hora que uma eólica ou solar fornece.

O cenário tem raízes na derrubada de árvores. Recente pesquisa do MapBiomas indica que a dinâmica de uso da terra baseada na conversão da floresta para pecuária e agricultura e a construção de represas contribuem para a diminuição do fluxo hídrico. Com base em imagens de satélite, os dados indicam uma perda de superfície de água de 15,7% entre 1985 e 2020, no Brasil.

Há 91 anos não se viam níveis tão baixos de água nos reservatórios do País como agora, e especialistas afirmam que essas mudanças podem afetar o transporte de commodities e o suprimento de outras nações, já que o Brasil é o maior exportador de grãos de soja, café e açúcar, e o segundo maior fornecedor de aço e milho. Segundo analistas, caso se confirmem as previsões de falta de chuva no período de outubro a abril, a inflação medida pelo IPCA deve ficar próxima aos 8% neste ano e no próximo. E o PIB nacional pode ter uma perda de até dois pontos percentuais em 2022, ficando na estagnação.

O quadro preocupa nove em cada dez empresários brasileiros, segundo levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) com base em quase 600 consultas. Os riscos se acumulam no tempo e poderão se intensificar em função do agravamento da mudança climática, conforme os alertas da ciência. Relatório da Agência Nacional de Águas (ANA) revela que, ao longo de 13 anos, as ocorrências de secas cresceram 409% no País. Na que ocorreu em 2013-2015 e atingiu fortemente o Sudeste, os preços da energia subiram e as indústrias diminuíram a produção por falta de abastecimento. O aumento de custos prejudicou a competividade e a queda da economia foi quase quatro vezes maior do que a projetada antes da crise hídrica para 2015.

Naquele ano, o mundo perdeu US$ 2,5 bilhões devido à escassez de água, conforme dados do CDP. O estudo colheu informações de 405 companhias de capital aberto listadas em bolsas de vários países: quase dois terços (65%) relataram que estão expostas a risco hídrico. No caso da multinacional francesa Engie, do setor elétrico, que teve redução das receitas em 2014 devido à falta de chuvas no Brasil, o impacto financeiro foi de US$ 223 milhões.

O mundo das finanças acorda – uma questão de sobrevivência

Em ambiente político-ideológico hostil aos temas ambientais e sociais, o Banco Central do Brasil (BC) – como órgão regulador da política monetária e da estabilidade financeira – desempenha papel-chave para o avanço da agenda ESG no Brasil. Neste ano, foram abertas duas consultas públicas para o arcabouço de normas destinadas a tratar riscos decorrentes das questões climáticas e socioambientais, visando a segurança do sistema financeiro e bancário. E, em 15 de setembro, o BC anunciou uma série de novas resoluções (consulte aqui).

Segundo analistas, para uma instituição reconhecida por avançar na inclusão financeira e inovações como o Pix e o open banking, navegar na seara ambiental é um passo necessário diante do movimento global que reúne os órgãos reguladores dos vários países no sentido de direcionar o capital para a sustentabilidade do planeta.

Na Resolução nº 4.327, de 2014, que estabeleceu a Política de Responsabilidade Socioambiental a ser implementada pelo sistema financeiro, o BC já havia dado a largada com debates que ganharam projeção internacional. Posteriormente, a Resolução nº 4.557, de 2017, exigiu a incorporação dos riscos socioambientais à estrutura de gestão das instituições financeiras.

Como pano de fundo, estavam o risco de ocorrência de eventos meteorológicos extremos cada vez mais frequentes, com impactos nos negócios e resultados dos investimentos, e o processo de transição para uma economia de baixo carbono. Em nota, o BC diz que “a discussão ganhou ainda mais notoriedade na pandemia da Covid-19, dada a confirmação de que eventos disruptivos possuem alto potencial de desencadear crises sistemicamente severas. A tríade ‘social, ambiental e climática’, que já era preocupante para a sociedade como um todo, tornou-se ainda mais relevante diante da expectativa de uma recuperação econômica mais sustentável e inclusiva”.

Nesse cenário, cabe ao BC, como propositor de regras aplicáveis às instituições reguladas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), o papel de manter o sistema sólido o suficiente para absorver possíveis impactos de eventos indesejados. “Mais compatíveis com a nova realidade, as políticas de responsabilidade tendem a ser um importante instrumento reputacional e de orientação estratégica, para que as instituições conduzam os seus negócios rumo a uma economia mais sustentável, reduzindo, assim, impactos negativos”, afirma a nota.

As novas normas, fruto das consultas públicas nº 85 e 86, encerradas para contribuições em 21 de junho, fazem parte do conjunto de medidas da Agenda BC#, que desde setembro de 2020 conta com a dimensão sobre sustentabilidade. Entre as novidades, está a nova resolução que estabelece a divulgação de informações sobre os riscos social, ambiental e climático, com base nas recomendações da Task Force on Climate-Related Financial Disclosures (TCFD).

Segundo o BC, será necessária a capacitação do quadro funcional sobre sustentabilidade, reformulação da política de responsabilidade, revisão da estrutura de gestão de riscos e comprometimento da alta administração da instituição. Além disso, a expectativa é a adoção de programas de verificação da eficácia da política. Em setembro, a instituição lançou relatório sobre riscos e oportunidades sociais, ambientais e climáticas com potencial de impactar o sistema financeiro nacional.

Termômetro no portfólio

Saber quanto a carteira de clientes contribui para a crise climática e definir como deslocar o capital para evitar os impactos – e os riscos à própria estabilidade das finanças – são hoje preocupações de vida ou morte para os bancos. Não basta economizar energia, reciclar o lixo das agências, dar mudinhas para correntistas ou fazê-los rodar calculadoras de carbono para ser mais ecológico no dia a dia. O desafio ganhou dimensão macro, diante do movimento ESG global com reflexos nas novas regras do Banco Central.

As instituições financeiras começam a corrida por entender, no fim das contas, como os seus lucros estão impactando o planeta. “Olhar para as emissões de carbono de projetos e empresas financiadas é o principal desafio”, reconhece Luciana Nicola, superintendente de relações institucionais, sustentabilidade e negócios inclusivos do Itaú Unibanco. A meta é investir R$ 400 bilhões até 2025 em setores mais sustentáveis, o que representa um terço da carteira total, mas há uma questão estratégica para a ambição climática fazer sentido: além de investir em quem faz certo, como influenciar os setores intensivos em gases de efeito estufa a emitir menos? Transferindo o capital para o baixo carbono? Tornando o crédito mais caro?

A opção tem sido o trabalho de engajamento com a construção de planos de mitigação em conjunto com os clientes, após um retrato do portfólio para identificar os diferentes níveis de impacto. “A ideia é mobilizar empresas a entrar na jornada”, afirma Nicola. Na metodologia Partnership for Carbon Accounting (PCAF), o banco mediu inicialmente as carteiras de veículos com 800 megatoneladas de carbono e de imóveis: propriedades com propósito comercial, como hotéis, escritórios, residências para aluguel, no total de 304 edifícios. O plano agora é conhecer as emissões de empresas de grande, médio e pequeno porte.

“Com base nisso, identificaremos os caminhos de mitigação, ajudando clientes nos planos de transição”, diz Nicola. A barreira, segundo ela, está na falta de métricas tropicalizadas, o que dificulta avanços em setores como agricultura e uso da terra, que representam 73% das emissões.

A segunda metodologia é o Paris Agreement Capital Transition Assessment (PACTA), que avalia como as emissões financiadas pelo banco estão alinhadas ao Acordo de Paris, no limite de aumento de 1,5 grau. “Queremos colocar o termômetro no portfólio e definir como baixar a temperatura até 2030, mas ainda não temos dados para saber o quanto estamos distantes”, revela Nicola. Enquanto isso, a estratégia é a gestão de riscos, conhecendo e priorizando os de maior exposição como emissores. “Entre os cenários traçados pelo IPCC, do mais ao menos catastrófico, adotamos o caminho do meio”, ressalta.

“A retirada de investimento em setores como carvão e fumo, por exemplo, notadamente de impactos ambientais, sociais e de saúde, precisa de um planejamento porque os municípios dependem economicamente dessa atividade e precisam de apoio à migração para outras culturas agrícolas”, explica a executiva.

Ela conta que o processo ESG no banco teve início há quatro anos, por meio de consultoria externa que identificou vetores de pressão e tendências de médio e longo prazo. Em 2019, foram lançados dez compromissos de impacto positivo para os diferentes perfis de clientes. A sustentabilidade deixou de ser uma agenda geral e passou a ser atrelada ao desempenho dos executivos da instituição.

Plano Amazônia, um ano depois – ainda em busca de escala

A importância para o clima global eleva o tom das cobranças na maior floresta tropical do planeta. Há pouco mais de um ano, quando o desmatamento batia recordes, as imagens das queimadas no Brasil corriam o mundo e ONGs eram atacadas como vilãs, os três maiores bancos privados brasileiros – além do Itaú, o Bradesco e o Santander – formaram uma aliança para canalizar investimentos na floresta em pé. O Plano Amazônia foi concebido com quatro prioridades: cadeia da carne, culturas sustentáveis, regularização fundiária e bioeconomia, prevendo 10 ações objetivas, mas até o momento não destinaram investimentos em escala ou adotaram políticas de exclusão para quem desmata.

A primeira demanda foi entender a complexidade da relação entre conservação e desenvolvimento econômico e buscar parcerias técnicas para tirar investimentos do papel, como crédito com taxa de juros que considera metas ambientais. De prático, os bancos chamaram os três maiores frigoríficos brasileiros – JBS, Marfrig e Minerva, responsáveis por 32% da carne amazônica – para analisar os compromissos já existentes na cadeia da pecuária.

“Há necessidade de olhar o setor como um todo e saber os gargalos que geram pouca visibilidade”, aponta Nicola. Para envolver também os pequenos e médios frigoríficos da Amazônia, que representam a maior parte da produção, a estratégia das áreas de risco dos bancos foi adotar as recomendações de boas práticas e prazos de adequação do programa Boi na Linha, do Ministério Público Federal.

Além do documento com recomendações, está sendo preparada uma lista de indicadores de performance (KPIs) de curto, médio e longo prazos para os bancos avaliarem suas carteiras de crédito ao setor. A primeira leva de dados deverá estar pronta até dezembro, segundo Nicola. Para ela, a rastreabilidade da carne é o ponto sensível, cujas propostas de solução deverão ser replicadas aos demais bancos, por meio da Febraban, e aos mercados varejistas.

Em relação à bioeconomia, o compromisso é investir inicialmente R$ 100 milhões em cooperativas e agroindústrias de cadeias produtivas da Amazônia, como a do açaí. Como suporte à estratégia, foi encomendado estudo sobre o mercado de produtos da floresta ao pesquisador da Universidade de Nova York Salo Coslovsky, que identificou alto potencial inexplorado para exportação.

Já no campo da regularização fundiária de pequenos produtores – quarto item do Plano Amazônia – nada avançou, porque os bancos dependem de decisões de governo. Só no primeiro semestre o governo lançou a tão esperada ferramenta de análise dinamizada do Cadastro Ambiental Rural (CAR), que permite examinar até 66 mil cadastros por dia, identificando a regularidade das propriedades, com checagem por imagens de satélite. A expectativa é o sistema abranger todos os estados amazônicos até o fim do ano.

“Devemos reconhecer que a floresta vale mais em pé, o que não está registrado nas contas da economia nacional”, afirma Sérgio Rial, presidente do Santander, em recente live do Plano Amazônia sobre o balanço do primeiro ano. “Antes a presença dos bancos considerava apenas a existência de PIB e não de pessoas e suas expectativas”, afirma.

“Compartilhar responsabilidades é um desafio a ser vencido, assim como ocorreu na vacinação contra a Covid-19”, compara Marcelo Pasquini, head de sustentabilidade corporativa do Bradesco, integrante da NetZero Banking Alliance. O banco evolui na análise de risco do portfólio corporativo, com dados que passaram a constar no relatório de sustentabilidade. No total, são R$ 412 bilhões, com emissão de 10,6 milhões de toneladas de carbono ao ano. Metade corresponde à indústria de transformação, como a de cimento, e algumas já anunciaram metas net zero até 2050.

O objetivo é investir R$ 250 bilhões na indústria de educação, saúde, infraestrutura de energia, substituição de frota e outros setores com viés ESG, em cinco anos. “O primeiro passo é quantificar emissões dos clientes para saber com quais trabalharemos prioritariamente para mudanças. A ideia não é excluir, mas ajudar na transição”, revela Pasquini. Ele explica: “Se sairmos, o crédito passa para outro banco sem comprometimento e a mudança não ocorre”.

Segundo ele, a estratégia da inclusão no lugar da exclusão não é, por exemplo, simplesmente parar a produção de cimento, que influencia o desenvolvimento nacional, mas investir em transformações nos processos fabris, para que não sejam sucateados e emitam mais gases estufa. O desafio inclui sensibilizar o conselho de administração das empresas, em contraponto a visões negacionistas: “É essencial o engajamento também de governos para maior alcance de impactos positivos, porque a sustentabilidade do setor financeiro está ligada diretamente à sustentabilidade do País”, completa o executivo.

[Um trecho deste texto foi alterado no dia 22/11/2021, no tópico “Biodiversidade na agenda”.]