Por Fernanda Macedo

Em um emocionante discurso de formatura de uma turma de faculdade na Universidade de Stanford, em 2005, Steve Jobs, doente à época, traça paralelos entre a morte e a inovação. “A morte é talvez a melhor invenção da vida. É o agente que faz a vida mudar. É eliminar o velho para dar espaço para o novo.” Mesmo que dolorosa, a mensagem apenas confirma o que a natureza demonstra. O tempo passa, as coisas mudam, nós nos tornamos obsoletos e a vida se renova.

Mas o que exatamente significa inovar? O que seria isso no século XXI? Limitado por recursos naturais escassos e com o desafio de atender necessidades humanas de uma população em crescimento [veja mais neste vídeo], o mundo de hoje precisa de inovações que nos tornem capazes de lidar com esse desafio. Por isso, alguns autores têm defendido que a sustentabilidade se tornou o fator-chave da inovação. Mas, primeiro, vamos entender o que é inovar, em seu sentido mais tradicional.

O que é inovação

Toda inovação nasce de uma nova ideia ou de uma invenção. Mas essas palavras não são sinônimos. A inovação é algo já implementado ou em oferta no mercado. A ideia e a invenção são algo ainda em elaboração, desenvolvimento ou teste.

Inovar pode ser um aspecto presente nas mais diversas frentes de uma empresa. Se um produto antigo é significativamente modificado ou um novo produto é criado, a empresa conquistou uma inovação de produto. Mas, se algo for modificado – ou criado – no processo de fabricação dessa mercadoria, então estamos falando de inovação de processo. No caso de cadeias de produção que são reorganizadas para uma nova forma de trabalho, como aconteceu no fordismo, temos uma inovação organizacional. E, por fim, mudanças numa embalagem, por exemplo, caracterizam as inovações de marketing.

Esses quatro tipos de inovação, extensamente detalhados no Manual de Oslo, são objetivos visados pela grande maioria das empresas. Eles trazem um potencial de eficiência, de diferenciação, garantindo uma vantagem em relação aos concorrentes.

As inovações podem provocar mudanças profundas na sociedade e virar de cabeça para baixo mercados já estabelecidos. É o que aconteceu com o mercado da música, por exemplo, ao enfrentar a concorrência dos dispositivos e serviços de música digital nas últimas décadas, precisando se reinventar. Ou ainda o setor de telecomunicações, que passou a ver a telefonia móvel e a indústria de computadores disputando o mesmo cliente assim que o iPhone chegou ao mercado.

Quando os impactos de uma inovação são tão significativos, capazes de afetar a estrutura do mercado, criar novos mercados ou tornar produtos existentes obsoletos, elas são chamadas de inovações radicais ou disruptivas. Mas somente passado algum tempo é que se poderá fazer essa análise, pois ela dependerá dos seus impactos observados sobre a realidade. Caso a inovação não chegue a provocar tantas mudanças, mas ainda assim garanta um período de vantagem no mercado para a empresa que a desenvolveu, ela é classificada de inovação incremental.

David Orban
David Orban

Andando juntas

Se, para os executivos em geral, a inovação é uma forma de garantir vantagens competitivas, atrair clientes e possivelmente reduzir custos e gerar receitas, temos uma feliz coincidência. A sustentabilidade corporativa visa os mesmos resultados para as empresas. E, com isso, cada vez mais sustentabilidade e inovação têm andado juntas.

O debate acadêmico em torno de um conceito sobre “inovação para a sustentabilidade” ainda é tímido em relação ao conceito tradicional e voltado para discutir o caráter teórico desse fenômeno. É importante ter em mente que esse tipo de inovação deve gerar benefícios não apenas para a empresa, mas para toda a sociedade, e deve resultar em alternativas com adicionalidades sociais e ambientais superiores quando comparadas a outras já existentes no mercado.

guiaPara tentar entender como esses conceitos se dão na prática, o Centro de Estudos em Sustentabilidade (GVces) da EAESP-FGV lançou em 2015 a iniciativa do Guia de Inovação para a Sustentabilidade em Micros e Pequenas Empresas. A partir das inovações observadas nos pequenos negócios brasileiros [veja nesta matéria como os pequenos negócios podem contribuir para este tema], esse Guia tem como objetivo reunir soluções que podem inspirar outros empreendedores, investidores e interessados em geral, além de reconhecer a importância dessas empresas para a sustentabilidade.

Em sua primeira edição, o Guia trouxe o caso prático de 11 empresas brasileiras. Entre elas estão tecnologias que têm crescido velozmente, como a da BrasilOzônio, capaz de gerar um poderoso germicida usando apenas o ar como matéria-prima, com diversas aplicabilidades na economia – do saneamento à pecuária. Há também empresas que encararam o desafio de problemas que até então estavam “órfãos” de empreendedores. Esse é o caso da Recomércio, empresa que se dedica a comprar smartphones usados, recondicionar e revendê-los por meio de uma plataforma. Em um País como o Brasil – em que existem mais aparelhos celulares do que habitantes, onde um smartphone é um bem de consumo caro e responsável por uma cadeia de alto impacto ambiental que contém, por exemplo, ouro e chumbo –, ampliar a vida desses aparelhos e popularizar seu acesso é uma bela contribuição.

Para identificar essas empresas, o GVces criou um processo seletivo que, em dois anos, avaliou (por meio de questionários on-line) 138 empresas e visitou em campo 46. Destas, 22 empresas foram selecionadas. Além das 11 divulgadas em 2015, mais 11 serão apresentadas em dezembro deste ano por Página22. Empreendedores interessados em participar devem acompanhar o website do Guia.

Além de lidar com um grande desafio da sustentabilidade, para ser efetivo um negócio inovador como esses precisa também dar escala à sua inovação. Para isso, este pequeno negócio tem várias opções. Ele pode crescer e se tornar uma empresa multinacional, levando sua tecnologia para os mais diversos locais. Ou ainda ingressar na cadeia de valor de uma grande companhia e, por meio dela, dar escala a sua solução. Pode ainda mirar em atender um mercado até então excluído, por exemplo levar energia a uma população que não tinha acesso a esse serviço. Pode também permitir que sua solução seja amplamente replicada pelos seus pares, garantindo uma rápida difusão no mercado.

As 22 empresas identificadas nestes dois anos de projeto do Guia já começam a seguir o caminho da escala e, com o tempo, veremos cada vez mais os resultados de suas soluções nas nossas vidas. Essa experiência mostra como se dá na prática a união dos conceitos inovação e sustentabilidade, que possuem muitos aspectos em comum. Cada vez mais o campo do empreendedorismo deve despertar para negócios que guardem em seu DNA uma importante característica: quanto mais prósperos, maior a sua contribuição para a sustentabilidade.