Editorial

Virada de chave

O mundo não comporta mais a destruição dos ecossistemas. Um perigoso ponto de não retorno se aproxima, a partir do qual a regeneração ambiental torna-se impossível e as perdas, irreversíveis. É preciso, portanto, virar a chave, ou seja, trocar a destruição pela conservação e ainda ir além: restaurar os ambientes que foram degenerados. Para surtir o efeito necessário, uma ação como essa precisa ocorrer em larga escala. Esse é um dos motivos para a Organização das Nações Unidas ter lançado este ano a Década da Restauração de Ecossistemas.

O chamamento, feito em 5 de junho no Paquistão, no Dia Mundial do Meio Ambiente, pretende alcançar os governos, as empresas, as organizações da sociedade civil, os pesquisadores e as comunidades que fazem a restauração acontecer na ponta, no chão de cada parte da Terra.

Após o malogro da Década da Biodiversidade (2011-2020), que não trouxe os resultados esperados, renovam-se as esperanças de que as ações sejam efetivas desta vez. Concorre para o sucesso o fato de que a restauração atende simultaneamente a demandas das três conferências globais do meio ambiente: Mudança Climática, Diversidade Biológica e Desertificação, como ressalta Matheus Couto, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, em entrevista nesta edição. Espera-se também que as empresas contribuam para esses movimentos, uma vez que se dizem cada vez mais empenhadas em atingir a neutralidade de carbono (net zero).

Mas o olhar precisa ir além do carbono, integrando a paisagem e sua complexidade ambiental e social. Esta edição mostra as peculiaridades de cada bioma brasileiro e as sinergias que emergem da atuação articulada das redes e seus diversos atores. Essa força é capaz de soprar novos ventos, por mais que as políticas ambientais e sociais do governo federal atuem na contramão do que precisa e deseja o mundo.

Agradecemos a parceria com o WWF-Brasil, que proporcionou esta produção jornalística, e com o qual tivemos a honra de construir conjuntamente a pauta sobre um tema tão estratégico para a humanidade.

Boa leitura!

 

Mensagem do WWF-Brasil

 

Sem restauração, não teremos futuro

 

A cada dia, a situação do planeta torna-se mais complexa e problemática. Apesar dos nossos esforços em parar a destruição do planeta – combatendo a destruição das florestas, dos mares e dos rios ou promovendo consumo responsável dos recursos naturais –, a escala de perda de vida segue em ritmo alarmante. Reverter essa curva de degradação dos ecossistemas naturais é o principal objetivo do WWF-Brasil. Um dos grandes agentes para essa transformação é a restauração de ecossistemas. Não basta parar de desmatar ou poluir, é preciso regenerar.

Complexa, a tarefa exige uma grande aliança ao redor do tema. Temos participado de arranjos institucionais junto a instituições como o Pacto pela Restauração da Mata Atlântica, a Articulação pela Restauração do Cerrado (Araticum), a Aliança pela Restauração na Amazônia, além de muitas outras, com o objetivo de acelerar a restauração nos principais biomas do País. Juntos queremos chegar à marca de 12 milhões de hectares restaurados ou em restauração com vegetação nativa até 2030 no Brasil, incluindo ecossistemas aquáticos.

Muito além do plantio de árvores nativas, a recuperação de ecossistemas envolve a escuta ativa e a criação de condições que assegurem a dignidade humana e os direitos dos povos indígenas, das populações tradicionais e de agricultores familiares em seus territórios. Contribui diretamente para um novo modelo de desenvolvimento, promove mudanças que transcendem a recuperação da biodiversidade local, promovendo a qualidade de vida e a economia sustentável por meio da geração de oportunidades de emprego e renda na cadeia produtiva da restauração.

Segundo um estudo das Nações Unidas, restaurar 350 milhões de hectares terrestres e aquáticos degradados até 2030 pode gerar US$ 9 trilhões em serviços ecossistêmicos, além de capturar entre 13 e 26 gigatoneladas de gases de efeito estufa da atmosfera.

Há condições institucionais para isso. O momento é crucial. E a decisão está nas mãos da sociedade. #JuntosÉPossível construir esse caminho.

 

Mauricio Voivodic, diretor-executivo do WWF-Brasil